quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Escalar-te lábio a lábio


Tela de Gustav Klimt

Escalar-te lábio a lábio
percorrer-te: eis a cintura
o lume breve entre as nádegas
e o ventre, o peito, o dorso
descer aos flancos, enterrar
os olhos na pedra fresca
dos teus olhos,
entregar-me poro a poro
ao furor da tua boca,
esquecer a mão errante
na festa ou na fresta
aberta à doce penetração
das águas duras,
respirar como quem tropeça
no escuro, gritar
às portas da alegria,
da solidão.
Porque é terrível
subir assim às hastes da loucura,
do fogo descer à neve.
Abandonar-me agora
nas ervas ao orvalho-
a glande leve.

Eugénio de Andrade

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