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terça-feira, 28 de julho de 2009

Sentirei a voz molhada...


Verei a cidade morta
Ir ficando para trás
E em frente se abrirem campos
Em flores e pirilampos
Como a miragem de tantos
Que tremeluzem no alto.
Num ponto qualquer da treva
Um vento me envolverá
Sentirei a voz molhada
Da noite que vem do mar
Chegar-me-ão falas tristes
Como a querer me entristar
Mas não serei mais lembrança
Nada me surpreenderá.

Vinicius de Moraes

sexta-feira, 26 de junho de 2009

...uma partida que não tem fim.


Tantas vezes já partiste
Que chego a desesperar
Chorei tanto, estou tão triste
Que já nem sei mais chorar

Oh, meu amado, não parta
Não parta de mim
Oh, uma partida que não tem fim

Não há nada que conforte
A falta dos olhos teus

Pensa que a saudade
Pode matar-me
Adeus

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Eu não existo sem você


Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos me encaminham pra você

Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver

Não há você sem mim
E eu não existo sem você
Vinicius de Moraes

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Não comerei da alface a verde pétala


Não comerei da alface a verde pétala
Nem da cenoura as hóstias desbotadas
Deixarei as pastagens às manadas
E a quem mais aprouver fazer dieta.


Cajus hei de chupar, mangas-espadas
Talvez pouco elegantes para um poeta
Mas pêras e maçãs, deixo-as ao esteta
Que acredita no cromo das saladas.


Não nasci ruminante como os bois
Nem como os coelhos, roedor; nasci
Omnívoro; dêem-me feijão com arroz


E um bife, e um queijo forte, e parati
E eu morrerei, feliz, do coração
De ter vivido sem comer em vão.


Vinicius de Moraes

domingo, 20 de janeiro de 2008

Aguarela


Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis rectas é fácil fazer um castelo
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva
E se faço chover, com dois riscos tenho um guarda-chuva
Se um pinguinho de tinta cair num pedacinho azul do papel
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu.


Vai voando, contornando a imensa curva norte e sul
Vou com ela viajando o Havai, Pequim ou Istambul
Pinto um barco à vela branco navegando
é tanto céu e mar num beijo azul.
Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo com suas luzes a piscar
Basta imaginar e ele está partindo, sereno e lindo
E se a gente quiser....... Ele vai pousar.



Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos, bebendo de bem com a vida
De uma América a outra eu consigo passar num segundo
giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo
Um menino caminha e caminhando chega no muro
e ali logo em frente a esperar pela gente o futuro está.




E o futuro é uma astro-nave que tentamos pilotar
Não tem tempo nem piedade, nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida
e depois convida a rir ou chorar
Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar

Vamos todos numa linda passarela
de uma aguarela que um dia em fim Descolorirá....
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo... (que descolorirá)
e com cinco ou seis rectas é fácil fazer um castelo... (que descolorirá)
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo. (e
descolorirá)



Vinicius de Moraes
Poeta brasileiro (1913-1980)